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Uma política industrial para o Brasil baseada no New Green Deal europeu e pequenas empresas

Atualizado: 17 de set. de 2021

Nos últimos 30 anos o Brasil perdeu sua capacidade industrial de forma dramática. Em 1990 estávamos entre os 7 maiores produtores industriais do mundo e a manufatura representava 34 % do PIB do nosso país. Hoje já não estamos nem entre os 15 países mais importantes e a manufatura é apenas 9 % do PIB. Não vamos aqui discutir as razões dessa perda de espaço, mas queremos mostrar que no pós-Covid uma janela de oportunidades se abrirá e a manufatura brasileira pode voltar a ser protagonista mundial, inserida em uma nova política industrial sustentável, apoiada no fomento à pequena empresa e à geração de empregos.



New Green Deal e Vulnerabilidades


Em busca de novas alternativas de desenvolvimento, a Comissão Europeia está coordenando o “New Green Deal”, pacto ecológico que tem como objetivo ser o eixo verde para todas as futuras iniciativas na Europa. Propõe uma política industrial que se torne neutra em carbono até 2050 minimizando os riscos de eventos climáticos extremos que, além de ceifar vidas, provocam enorme prejuízo econômico aos territórios onde incidem.


No caso do nosso país deveríamos pensar em algo semelhante, que contemplasse além dos aspectos ecológicos, os aspectos sanitários e socioeconômicos - com ênfase nas pequenas empresas - nos preparando, assim, para a eventualidade de prováveis novas epidemias e para evitar ou minimizar a quebra das pequenas empresas, segmento perversamente afetado pela crise atual.


Segundo estudos científicos o mundo estará, ainda por muito tempo, em estado de alta vulnerabilidade à incidência de outras pandemias, dadas as condições de grandes aglomerações humanas e de um modelo civilizatório predatório que vem impactando gravemente o equilíbrio ecológico do planeta.

Além de já estar sofrendo com eventos climáticos desfavoráveis, o Brasil passa por uma grave crise social causada pelo declínio da atividade econômica e do poder de compra da população.


O fechamento massivo de pequenos empresas vem causando um desemprego ainda maior do que o já existente. Para reflexão e debate trazemos aqui uma proposta de uma nova e robusta política industrial para o Brasil, que contemple a autossuficiência em produtos essenciais para o bem-estar, saúde e segurança da população, que seja direcionada às pequenas empresas, grandes geradoras de emprego e trabalho, e seja embasada em parâmetros ecologicamente sustentáveis.



As pequenas empresas e a geração de empregos


As pequenas empresas são fundamentais para a nova política industrial, pois apenas elas vão conseguir diminuir o enorme desemprego que assola o Brasil. Já são 14 milhões de pessoas desempregadas e o número tende a aumentar se considerarmos os jovens que a cada ano precisam entrar para o mercado de trabalho. E nessa hora temos que levar em conta que as grandes empresas, após a pandemia, vão partir para um processo muito intenso de uso de automação utilizando robôs, impressoras 3D e inteligência artificial, não criando os empregos que precisamos. Ou seja, só mesmo a pequena empresa terá condições de gerar a imensidão de postos de trabalho que se faz necessária.


Porém para que isso aconteça, muito terá que ser mudado na forma como o Brasil trata suas pequenas empresas e seus pequenos e microempreendedores. Enquanto em países da Europa este segmento recebe atenções especiais, o que faz com que mais de 40 % das exportações italianas, por exemplo, seja originada nas micro e pequenas empresas, no Brasil essa porcentagem cai para um vergonhoso 1 %.


Por que a diferença astronômica entre Brasil e Itália? Porque na Itália existem políticas públicas que estimulam fortemente a união das pequenas, para que juntas consigam exportar ou desenvolver tecnologia. Este é apenas um exemplo, mas na maioria dos países europeus há inúmeros outros setores como supermercados, farmácias, restaurantes onde só pequenas podem atuar. Lembremos também que boa parte das compras públicas obrigatoriamente deve ser canalizada para pequenas e microempresas.



Uma nova política industrial


A nova Política Industrial deve estabelecer também o conceito de que há setores estratégicos, onde o país não pode de maneira nenhuma depender de importações, como aconteceu durante a pandemia em que não tínhamos sequer a produção de máscaras, aventais e demais equipamentos de proteção individual – EPIs - para atender o setor de saúde e tivemos que depender da importação de tecidos, elásticos e outros insumos desta natureza. Estes setores, inclusive o têxtil que já foi tão prospero no país, devem merecer estímulos e subsídios para que estejam aptos, e em boas condições, nos momentos em que forem chamados à ação.


Com a nova Política Industrial as empresas brasileiras passariam a investir mais em Pesquisa & Desenvolvimento, pois cresceria a confiança nos propósitos governamentais A pesquisa no Brasil deve contemplar áreas onde temos possibilidade de nos destacar em nível mundial. Especialistas consideram que em menos de 30 anos as grandes transformações virão das chamadas ciências da vida, como a genética, a medicina, a farmacêutica e, principalmente, a biotecnologia. A matéria prima fundamental da biotecnologia é a biodiversidade e o conhecimento sobre os princípios ativos embutidos na flora e na fauna. O Brasil é justamente o maior país megabiodiverso do mundo e biomas como a Amazônia e o Cerrado constituem-se em celeiros de insumos para centenas de milhares de produtos alimentícios, fármacos, cosméticos, médicos e têxteis, entre tantos outros.


Apesar de o Brasil ser um dos países mais propícios ao desenvolvimento de fontes limpas de energia, não dispomos ainda de produção suficiente de energia solar e eólica. A nova política industrial deve prover incentivos para a expansão dessas matrizes, garantindo uma segurança energética de baixo carbono. Ao mesmo tempo, deve estimular a indústria de transporte de cargas sobre trilhos, incentivar a produção de carros elétricos, diminuindo a dependência de combustíveis fósseis cumprindo assim. as metas assumidas no Acordo de Paris.

Não se pode esquecer que necessitamos ter políticas claras e estímulos fortes para a indústria da reciclagem, do reflorestamento, da revitalização de nascentes, da produção orgânica, assim como a produção de fitoterápicos, cosméticos e alimentos fit, que utilizam mão de obra intensiva, pois dependem pouco de automação, o que significaria, além do fortalecimento das pequenas empresas, uma grande geração de empregos.


Precisamos adotar conceitos de economia circular, com reaproveitamento total dos recursos naturais e dos recursos humanos com desperdício zero. De materiais e de pessoas.


Desta forma, após a crise da COVID 19 poderemos dar um salto, dado possuirmos fontes limpas de energia abundantes e matérias prima básicas para diversos setores essenciais deste século. No passado deixamos de embarcar em diversas ondas tecnológicas, mas nenhuma nos foi tão favorável quanto esta. É urgente que tenhamos uma política industrial onde se defina de que forma queremos usar esta imensa riqueza que possuímos e como seremos protagonistas da Revolução da Energia Limpa e da Biotecnologia e não um mero exportador de matérias primas, como temos sido desde as revoluções anteriores.

Estamos diante de uma mudança estrutural da economia mundial desencadeada pela pandemia. Existe uma brecha que pode ser aproveitada pelos países que forem mais rápidos no planejamento e na execução de uma nova política industrial para si próprios. Há que se considerar que no caso brasileiro a política industrial precisa contemplar geração de empregos e não se pode esperar que o mesmo venha da grande empresa, pois ela está empenhada em automação e redução de custos e corte de mão de obra. Ou seja, na nova política industrial a pequena empresa precisa ter um papel de destaque. Mas sem uma firme atuação governamental e o protagonismo do setor industrial corremos o risco de ficar onde estamos.


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(*) Miriam Duailibi é presidente do Instituto ECOAR e Paulo Feldmann professor da FEAUSP.


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